37 – Análises de grupos testam a importância da ativação dos genes miogênicos durante a hipertrofia das fibras musculares em humanos
Comentário: Prof. Dr. José Maria Santarem*
Análises especializadas confirmam que as grandes diferenças nas respostas ao treinamento hipertrófico são controladas geneticamente.
Marcas M. Bamman, John K. Petrella, Jeong-su Kim, David L. Mayhew, and James M. Cross, 2007.
J Appl Physiol 102: 22322239, 2007.
Quando atletas de ponta em musculação competitiva são observados em treinamento chamam a atenção as grandes cargas utilizadas e a intensidade dos exercícios. A impressão do observador pode ser no sentido de que os campeões de musculação treinam diferente da maioria das pessoas e por isso conseguem grandes volumes musculares e força. Outra possível interpretação pode ser imaginar que os melhores resultados do treinamento são devidos ao uso de drogas anabolizantes.
A observação tem demonstrado ao longo dos anos que o resultado do treinamento hipertrófico varia muito entre as pessoas: alguns poucos conseguem excelentes resultados, a maioria consegue resultados discretos e outros quase não reagem. Hipóteses habituais para explicar essas diferenças são que algumas pessoas são mais determinadas do que outras, mais constantes no treinamento, melhor orientadas do ponto de vista técnico, alimentam-se melhor, utilizam melhor os suplementos nutricionais ou utilizam drogas.
O presente trabalho esclarece essa questão: as poucas pessoas que reagem muito bem ao treinamento apresentam grande ativação dos genes responsáveis pela hipertrofia muscular (neste trabalho aumentaram mais de 60% a área de secção transversal das fibras em 4 meses de treinamento). As pessoas que reagem de forma mediana apresentam ativação também mediana desses genes (neste trabalho aumentaram cerca de 30% na área das fibras). As pessoas que reagem muito mal, apresentam ativação gênica quase nula (neste trabalho com aumentos insignificantes na área das fibras). Assim sendo, pode-se afirmar com toda certeza que campeões de musculação não treinam diferente: reagem diferente.
Evidentemente todas as outras hipóteses levantadas para explicar as diferenças nos resultados do treinamento hipertrófico podem ter a sua parcela de contribuição, mas o mais importante são as reações geneticamente controladas. Quando um jovem começa a se exercitar com pesos, geralmente faz o que a maioria faz em termos de exercícios e alimentação. Ao notar que aumenta rapidamente o volume dos músculos e a força, o entusiasmo e o estímulo dos companheiros fazem com que passe a treinar com mais intensidade e dedicação. Os psicólogos da área comportamental conhecem bem o poder dos chamados “reforçadores positivos”. O passo seguinte habitualmente é entusiasmar-se por competições e buscar academias que reúnem pessoas com as mesmas boas reações e mesmas motivações. A impressão que se pode ter é que em determinados locais (algumas academias da Califórnia, por exemplo) os profissionais conhecem os “segredos” do sucesso, quando na realidade apenas cultivam um ambiente que atrai quem reage bem aos treinamentos.
Os autores deste trabalho inicialmente esclarecem que já foi demonstrada a ativação de diversos genes envolvidos na hipertrofia muscular pela sobrecarga tensional, que é a contração muscular contra resistências. Todas as pessoas possuem esses genes, mas a ativação dependente da sobrecarga mecânica é diferente entre os indivíduos. Alguns desses genes são: IGF-1Ea e IGF-1Ec (mechanogrowth fator MGF), que controlam a produção de IGF-1. Outros genes miogênicos são a miogenina, MyoD, myf-5 e myf-6. O IGF-1 (Insulin-like Grow Factor-1) é uma substância com potente ação estimulante da hipertrofia muscular. O hormônio do crescimento estimula a produção hepática de IGF-1, mas a sobrecarga mecânica determina a produção de IGF-1 nos próprios músculos esqueléticos, estimulada pela ativação dos genes correspondentes. Além de estimular a síntese proteica, o IGF-1 leva à proliferação das células satélites dos músculos. Essas células podem se transformar em novos núcleos nas fibras musculares, potencializando a síntese proteica pós-exercício e levar à formação de novas fibras, o que é importante no processo de reparação muscular.
Neste trabalho uma amostra populacional de sessenta e seis pessoas foram treinadas com pesos com exercícios para o grupo muscular do quadríceps durante 4 meses, sendo 15 mulheres e 14 homens com idade entre 60 e 75 anos, e 16 mulheres e 21 homens com idade entre 20 e 35 anos. As pessoas eram saudáveis e sedentárias, não obesas. Os idosos realizaram avaliação clinica geral e teste ergométrico. Nenhum dos participantes recebia reposição hormonal.
O programa de treinamento consistiu em agachamento com barra, leg press 45 graus e cadeira extensora, três vezes por semana. Após aquecimento, esses exercícios foram realizados em três séries de 8 a 12 repetições realizadas até a fadiga, com 90 segundos de descanso entre séries. Os pesos foram aumentados sempre que a pessoa conseguia realizar 12 repetições em pelo menos duas séries de cada exercício. A intensidade dos exercícios foi a mesma (alta) para todos os participantes e a frequência ao treinamento também foi elevada para todos. Os testes de carga máxima (1RM) ocorreram no início do programa, no meio e no final das 16 semanas, permitindo calcular que os pesos utilizados corresponderam a cerca de 80% de 1RM. Biópsias do músculo vasto lateral foram realizadas antes do início do experimento, 24 horas após a primeira sessão de treinamento e 24 horas após a última sessão, com o objetivo de avaliar a área de secção transversal das fibras musculares e medir a ativação gênica nos músculos.
A técnica estatística de análise de clusters (grupos) foi utilizada para definir três tipos de resposta ao treinamento hipertrófico, com base no aumento de área de secção transversal apresentado após 4 meses de exercícios:
1) Extremamente Respondentes (25% da amostra): 17 pessoas (jovens: 9 homens e 3 mulheres; idosos: 2 homens e 3 mulheres) Aumentaram mais de 60%.
2) Medianamente Respondentes (50% da amostra): 32 pessoas (jovens: 11 homens e 8 mulheres; idosos: 6 homens e 7 mulheres) Aumentaram perto de 30%.
3) Não Respondentes (25% da amostra): 17 pessoas (jovens: 1 homens e 5 mulheres; idosos: 6 homens e 5 mulheres). Apresentaram aumentos insignificantes.
Alguns dos resultados encontrados:
a) A avaliação dos genes relacionados à hipertrofia muscular mostrou que a sua ativação foi proporcional às respostas apresentadas ao treinamento hipertrófico. Isso demonstra que as diferenças nas respostas hipertróficas são determinadas pela ativação gênica. No entanto, a identificação dos genes mais importantes não foi possível neste trabalho.
b) A hipertrofia muscular ocorreu tanto nas fibras brancas quanto nas vermelhas, mas com maior magnitude nas fibras brancas. Tanto antes quanto depois do treinamento as fibras brancas foram maiores do que as vermelhas.
c) As fibras brancas do tipo IIx (IIb) tenderam a transformar-se em fibras IIa. Isso era o esperado, visto que o treinamento de força estimula o aumento da capacidade aeróbica dos músculos.
d) Após 2 meses de treinamento a força muscular aumentou entre 25 e 30% nos três grupos de resposta hipertrófica. Nos segundos 2 meses de treinamento a força muscular aumentou cerca de 10% apenas nos dois grupos que tiveram alguma resposta hipertrófica. Esse comportamento da força muscular é compatível com o conhecimento de que a melhor coordenação do recrutamento de unidades motoras é muito importante no início do treinamento e que os ganhos posteriores dependem mais da hipertrofia muscular. Outro aspecto é que mesmo as pessoas que não respondem ao treinamento hipertrófico apresentam aumento importante da força, garantindo para todas as pessoas, em todas as idades, a possibilidade de melhora na funcionalidade para a vida diária.
Metodologia, tabelas, gráficos e bibliografia encontram-se no artigo original.
Comentários: José Maria Santarem
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